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ARTIGO: Acesso à Justiça e Devido Processo Legal – por Paulo Medina

Página Inicial / ARTIGO: Acesso à Justiça e Devido Processo Legal – por Paulo Medina

Paulo Roberto de Gouvêa Medina

Professor Emérito da Universidade Federal de Juiz de Fora.

Conselheiro Federal da OAB, por Minas Gerais.

Resumo: O texto procura mostrar que um dos aspectos do acesso à justiça, quiçá, o mais importante – a busca da tutela jurisdicional — só pode ser plenamente realizado por meio do devido processo legal. As características deste são examinadas à luz de diplomas internacionais que o definem. Cuida-se de aferir em que medida o Código de Processo Civil vigente e o novo Código, em via de aprovação no Senado, as perfilham. Com o intuito de apurar a real efetividade do processo, no Brasil, analisam-se, ademais, a estrutura e o funcionamento do Poder Judiciário, assim como as condições de exercício da advocacia e o papel desempenhado pela Defensoria Pública. Os meios alternativos de solução de conflitos são mencionados como outra faceta relevante do acesso à justiça.

Palavras-Chave: Acesso à Justiça – Acesso à ordem jurídica – Devido processo legal

Abstract: The objective of this article is to reveal that one of the aspects of access to justice, perhaps, the most important – the pursuit of judicial review – can only be fully realized through due process of law. The features of the latter are examined in the light of international instruments that define it. The text analyze to what extent the current Code of Civil Procedure and the new Code, in the process of passing the Senate, adopted the characteristics of the aforementioned due process. An analysis is made, in order to determine the actual effectiveness of the process in Brazil, moreover, the structure and the functioning of the judiciary, as well as the conditions for the practice of law and the role of the Public Defender. Alternative dispute resolution methods are mentioned as another important facet of access to justice.

Keywords: Access to justice – Access to the legal system – Due process of law

Sumário: 1. Acesso à Justiça: sentido, alcance e perspectivas. 2. Devido Processo Legal: elementos característicos. 3. O direito brasileiro e o devido processo legal. 4. Acesso à Justiça e meios alternativos de solução de conflitos. 5. Acesso à Justiça, estrutura e funcionamento do Poder Judiciário. 6. Acesso à Justiça e exercício da advocacia. 7. Conclusões. 8. Referências Bibliográficas.

1. Introdução: Acesso à Justiça – sentido, alcance e perspectivas

A expressão acesso à justiça é daquelas que parecem exprimir menos do que pretendem significar. Assim como sucede com as disposições legais que se mostram acanhadas em relação ao seu sentido, para melhor compreendê-la é preciso adotar interpretação extensiva das palavras em que se traduz.
Quando se cogita do acesso à justiça tem-se em vista, na verdade, uma gama de interesses do cidadão no sentido de fazer valer seus direitos, assim como a esperança de contar com meios idôneos para viabilizar esse intento. Tais interesses e expectativas vão desde o conhecimento do direito objetivo até a satisfação plena das pretensões geradas pela incidência das normas legais sobre os fatos, passando, por conseguinte, pela existência de adequados instrumentos de tutela, pela regularidade do exercício do direito de ação, pelas condições em que se instaura e se desenvolve o processo respectivo, pelo funcionamento dos órgãos encarregados de conduzi-lo, pelas possibilidades que têm, em suma, as pessoas de usufruir de todo esse sistema jurídico.
Escrevemos alhures que ter acesso à Justiça é ver reconhecida a cidadania na condição de jurisdicionado . Quisemos mostrar, assim, que o acesso à Justiça é atributo essencial da cidadania .
Os múltiplos aspectos do acesso à justiça revelam implicações de ordem política, social e jurídica, cada uma delas a exigir considerações especiais .
No plano político-institucional, o acesso à justiça é consectário do direito de petição, remontando ao Bill of Rights, de 1689. Como enfatiza Eduardo Couture, “El derecho constitucional de petición no es otra cosa que el derecho de comparecer ante la autoridad.” Ser ouvido pela autoridade pública, seja esta vinculada a esse ou àquele Poder, é o escopo do acesso à Justiça. Os americanos cunharam expressão bastante significativa para traduzir essa ideia, no plano do Judiciário: his day in Court – como a significar que o cidadão tem direito ao seu dia perante o Tribunal competente para apreciar sua defesa ou sua pretensão ou que o Tribunal há de lhe reservar momento próprio para manifestar-se sobre o direito que invoca, já que o Judiciário existe para servir ao cidadão, dando-lhe, em nome do Estado, a tutela jurisdicional cabível .
Do ponto de vista social, sobreleva a consideração de que o acesso à Justiça só poderá ser alcançado se os desníveis sociais dos jurisdicionados não impedirem o desenvolvimento do processo, cumprindo, para tanto, que se busque um sistema tão próximo quanto possível do ideal de uma igualdade de armas, em que os desprovidos de recursos gozem de eficiente assistência jurídica, na linha do que preconiza a Constituição brasileira (art. 5º, LXXIV) . Ponto relevante desse aspecto do tema é o de que o acesso à justiça implique a possibilidade, a todos franqueada, de exercer o direito de ação, ao mesmo tempo em que traga reais perspectivas de que, assim agindo, a parte logrará obter, no seu interesse e no interesse da comunidade, um resultado efetivo e justo .
Quanto ao enfoque jurídico do tema, tudo se resume à observância do devido processo legal, uma ideia-síntese, que, em última análise, compreende as exigências básicas do acesso à Justiça. A concepção do devido processo legal, cujo embrião estava na Magna Carta, de 1215 (mais precisamente na exigência de um julgamento regular, segundo a law of the land), consolidou-se em 1791, com a 5ª. Emenda à Constituição dos Estados Unidos, na qual se declarou que “ninguém será privado da vida, da liberdade ou da propriedade without due process of Law”, alargando-se, posteriormente, a doutrina construída em torno do instituto, de modo a torná-lo não só uma garantia em face do juízo, mas, também, forma de “assegurar uma igualdade de tratamento por qualquer autoridade” . A Emenda Constituiconal nº 14, de 1868, introduzindo o princípio da equal protection of the Law, completou o sentido dessa garantia .
É sob o ângulo por último assinalado que versará o presente texto. O acesso à Justiça será, aqui, examinado à luz do devido processo legal, considerando o modelo que se deve ter em vista e as condições em que ele se apresenta na legislação processual brasileira. Ter-se-ão em conta, igualmente, as perspectivas que se abrem para o aperfeiçoamento desse modelo, com o breve advento, entre nós, de um novo Código de Processo Civil.

2. Devido Processo Legal: elementos característicos

A concepção do acesso à justiça, no sentido em que, aqui, a tomaremos, aparece sempre associada ao conceito de devido processo legal. Documentos legislativos mais ou menos recentes, ao definirem acesso à Justiça, indicam como um dos seus pressupostos o devido processo legal.
A Constituição da República Portuguesa, de 1976, é, talvez, a que melhor explicita a ideia de acesso à justiça, dando-lhe a amplitude assinalada no item anterior. No art. 20, que traz a epígrafe Acesso à Justiça e tutela jurisdicional efectiva, a moderna Carta Política de Portugal preceitua que A todos é assegurado o acesso ao direito (item 1), acrescentando, no que diz respeito à tutela jurisdicional, propriamente, que esta deve ser prestada em prazo razoável e mediante processo equitativo (item 4) e dispondo, ainda, que, Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos (item 5).
Documentos internacionais anteriores já haviam delineado o sentido do acesso à Justiça, embora – frise-se – sem a precisão da Constituição Portuguesa.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, estabeleceu, no art. 10:

Todo homem tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou dos fundamentos da qualquer acusação contra ele.

Na linha dessa disposição e alargando o que nela se contém, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos — o chamado Pacto de San José da Costa Rica, de 1969 — dispôs, no seu art. 8, item 1:

Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, instituído com anterioridade pela lei, em face da apresentação de qualquer acusação penal contra ela, ou para a determinação de seus direitos ou obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outro caráter.

Acrescentou a referida Convenção, no item 2 do mesmo artigo, que, ao ser ouvida em juízo, a parte terá direito a algumas garantias mínimas, como a de ter conhecimento prévio da acusação que lhe seja imputada, de ser assistido por um defensor de sua escolha ou indicado pelo Estado, de produzir provas, de ser tido, em princípio, como inocente, até prova em contrário e não ser compelido a autoincriminar-se; finalmente, de recorrer da decisão do juiz ao tribunal superior.
A Constituição Européia, de 2005, dedicou, igualmente, um artigo ao Direito a um recurso efetivo e ao acesso a um tribunal imparcial — o art. 107, da Parte II –, que assim preceitua, nos seus dois primeiros enunciados:

Toda pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União hajam sido violados tem direito a um recurso efetivo diante de um tribunal em respeito às condições previstas no presente artigo. Toda pessoa tem direito a que sua causa seja conhecida equitativamente, publicamente e num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, instituído previamente pela lei.

Dos quatro diplomas legais citados, podem-se extrair, à luz da doutrina que se firmou a esse respeito, os elementos característicos do acesso à Justiça:
a) o acesso à justiça, com o fim de tutelar a liberdade pessoal ou garantir uma pretensão de ordem civil, há de fazer-se mediante o devido processo legal;
b) o devido processo legal exige que a causa seja apreciada por um juiz ou tribunal que corresponda ao chamado juiz natural, na medida em que haja sido previamente instituído por lei, para a apreciação de casos da natureza daquele que lhe é submetido a julgamento, na hipótese concreta;
c) exige mais: que as regras de competência sejam estritamente observadas;
d) e, ainda: que os juízes individuais ou coletivos sejam dotados de garantias que lhes assegurem a independência, e exerçam a jurisdição com imparcialidade, isto é, sem que existam motivos que os tornem impedidos ou suspeitos para atuar no caso de que se trate;
e) que o julgamento da causa se dê num prazo razoável, estabelecendo-se, para tanto, procedimentos abreviados, que possibilitem uma justiça célere;
f ) que os processos tramitem em regime de publicidade;
g) que sejam observados critérios capazes de assegurar um julgamento equitativo ou em igualdade de condições – o que induz à observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, este último assegurado tanto sob a forma da defesa técnica (isto é, feita por advogado da escolha da parte ou indicado pelo Estado), quanto sob a forma da defesa pessoal;
h) que seja, igualmente, assegurado o direito de produzir provas e que ninguém fique sujeito a ter contra si produzida prova considerada ilícita;
i) que haja possibilidade de recurso da decisão de um juiz singular ou monocrático para o tribunal superior, com o fim de possibilitar o reexame da sentença de primeiro grau que tenha sido desfavorável ao recorrente;
j) que o processo penal se norteie pelos princípios da presunção de inocência e da não autoincriminação;
k) que, finalmente, o acesso à justiça seja efetivo ou conduza a uma solução eficaz das pretensões deduzidas perante o órgão judiciário competente.

Tais são as condições do acesso à justiça e os pressupostos do devido processo legal, tendo-se este como indispensável à sua realização.
A doutrina sobre o tema explicita, com propriedade, alguns dos elementos colhidos nos diplomas internacionais citados.
Eduardo Couture, já na década de 40 do século passado, antecipando-se aos documentos internacionais referidos, sintetizava os requisitos mínimos do devido processo legal, apontando como essencial à sua configuração a necessidade de que o demandado tenha conhecimento da pretensão contra ele deduzida e se lhe proporcione prazo razoável para defender-se e produzir provas, perante o tribunal competente, que há de ser composto de juízes probos e imparciais .
Outros autores, escrevendo mais recentemente, consolidaram a orientação a que nos reportamos.
José Augusto Delgado, depois de destacar alguns corolários do princípio aqui estudado, observa que “a expressão maior do devido processo legal está em garantir os dogmas do contraditório e da ampla defesa” .
Carlos Roberto Siqueira Castro enfatiza a indeclinável necessidade de que os procedimentos sejam estabelecidos em lei, que as sentenças sejam motivadas e que o direito de ação seja exercido sem ônus exorbitantes, no que se refere às custas e taxas judiciárias .
José Celso de Mello Filho, hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, em obra anterior à Constituição vigente , alinhava os elementos característicos do devido processo legal de forma coincidente com a aqui observada, destacando, já então, garantia que lhe é inerente e que a Carta de 1988 viria tornar expressa — a que veda a produção de provas ilícitas (Constituição, art. 5º, LVI).

3. O direito brasileiro e o devido processo legal

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, assegura, expressamente, o devido processo legal, ao dispor, no inciso LIV do art. 5º, que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Desde a Constituição de 1946, na verdade, a cláusula correspondente já estava contemplada no preceito, então instituído, que, hoje, aparece, com a redação ampliada, no inciso XXXV do artigo citado: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito . Este inciso perfilha, a um tempo, os princípios do devido processo legal e da inafastabilidade da tutela jurisdicional. Nele se constitucionaliza, ademais, o direito de ação. É, por tudo isso, o dispositivo matriz da Constituição no que concerne ao direito processual.
Bastava o estatuído no art. 5º, XXXV, para que a Carta Constitucional brasileira traduzisse sua plena adesão aos ideais do acesso à justiça e do devido processo legal. Mas, a Constituição ainda explicita alguns consectários lógicos desses princípios, ao consagrar, no mesmo artigo, as garantias do juiz natural (inciso LIII), da inexistência de juízo ou tribunal de exceção (inciso XXXVII), do contraditório e da ampla defesa (inciso LV), da publicidade e da motivação das decisões (art. 5º, LIX, c/c art. 93, IX), da inadmissibilidade de provas ilícitas (inciso LVI), da razoável duração do processo e da celeridade de sua tramitação (inciso LXXVIII), da presunção de inocência do acusado (inciso LVII) e da não autoincriminação (inciso LXIII), além de outras pertinentes ao processo penal.
Vem ao encontro desse elenco de garantias, como que a coroá-lo, princípio constitucional que, dirigindo-se, embora, segundo a dicção legal, à administração pública, aplica-se também ao Poder Judiciário: o princípio da eficiência (Constituição, art. 37, caput). Milton Paulo de Carvalho o inclui entre os princípios-fins do processo, ao lado do que diz respeito ao acesso à justiça e dos seus consectários – os princípios do juiz natural, do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, entre outros .
A eficiência no plano processual traduz-se na efetividade da prestação jurisdicional. Paulo Cezar Pinheiro Carneiro resume esse escopo do acesso à justiça asseverando: É fundamental que o processo possa assegurar ao vencedor tudo aquilo que ele tem direito a receber, da forma mais rápida e proveitosa possível, com menor sacrifício para o vencido”.
O Código de Processo Civil atende, quantum satis, ao modelo do devido processo legal. O princípio dispositivo constitui sua viga mestra, ficando consolidado pelos seus corolários essenciais: os princípios da demanda ou da iniciativa da parte, da eventualidade, da correlação entre a sentença e os fatos alegados e provados pelas partes, da adstrição do juiz ao pedido da parte. Busca o Código alcançar a celeridade e a efetividade por meio do julgamento antecipado da lide (art. 330) e da antecipação provisória da tutela (art. 273), podendo esta vir a ter caráter definitivo na hipótese em que um ou mais pedidos cumulados se mostrem incontroversos. Admite a produção da prova mediante todos os meios legais ou que sejam moralmente legítimos (art. 332), sem adstringi-la a um elenco predeterrminado de modalidades probatórias. Respeita o contraditório e assegura a ampla defesa, assim como define as regras de competência segundo critérios consentâneos com esses princípios, a começar daquele que corresponde à regra actor sequitur forum rei, isto é, indicando como competente, em geral, o foro do domicílio do réu (art. 94). Impede a atuação, no processo, do juiz sobre o qual recaia motivo de impedimento (art. 134) ou de suspeição (art. 135). Adota o princípio do duplo grau de jurisdição, atribuindo ao recurso que se destina a assegurá-lo – a apelação – duplo efeito, o devolutivo e o suspensivo, com as exceções naturais (art. 520). Prevê que, havendo vários meios de promover a execução, esta se fará pelo modo menos gravoso para o devedor (art. 620).
O novo código, cujo projeto acha-se em fase de votação final no Senado, depois de revisto pela Câmara dos Deputados, tende a manter e ampliar esse quadro, pondo-se em plena sintonia com o devido processo legal. A igualdade das partes – ou paridade de tratamento — é preocupação básica do projeto, competindo ao juiz velar pelo efetivo contraditório, segundo reza o art. 7º. Em mais de um artigo, aliás, o novo estatuto processual procura assegurar o contraditório, dispondo, no art. 9º, que Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida; preceituando, no art. 10, que o órgão jurisdicional não pode decidir com base em fundamento a respeito do qual não se tenha oportunizado manifestação das partes, ainda que se trate de matéria apreciável de ofício. A decisão de mérito haverá de ser justa e efetiva (art. 6º) e proferida em prazo razoável, dentro do qual a parte tem direito de obter solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa (art. 4º). Procurando conciliar os valores celeridade processual – segurança jurídica, institui o novo Código a tutela antecipada, de natureza satisfativa ou cautelar, a qual poderá fundamentar-se em critérios de urgência ou de evidência (arts. 295/312).
O duplo grau de jurisdição continua assegurado, como convém, com a atribuição de efeito suspensivo à apelação. É a regra que o art. 1.025 adota, com as exceções de praxe, previstas no seu § 1º. Modificou-se, assim, o tratamento dado à matéria pelo projeto originário do Senado, cujo art. 908 dispunha que Os recursos, salvo disposição legal em sentido diverso, não impedem a eficácia da decisão, cabendo ao tribunal competente, no exercício privativo do juízo de admissibilidade (art. 926), atribuir-lhe, ou não, efeito suspensivo, sem o qual o apelado poderia promover, desde logo, a execução provisória da sentença (art. 928). Em boa hora, a Câmara dos Deputados, atenta à longa tradição do nosso direito e à circunstância de que sentenças emanadas de juízos monocráticos, de primeiro grau, devem comportar impugnação no duplo efeito, restabeleceu o efeito suspensivo, como regra, no recurso de apelação. Nesse sentido, propugnando por semelhante reformulação, já se haviam manifestado respeitados juristas .
À luz do Pacto de San José da Costa Rica (art. 8º, item 2), o duplo grau é um dos elementos do devido processo legal. Entre nós, acatados doutrinadores sustentam, aliás, ponto de vista consentâneo com essa disposição. Ada Pellegrini Grinover, há muito, asseverou que o duplo grau de jurisdição “faz parte, sem dúvida alguma, daquele conjunto de garantias que configuram o “devido processo legal”. A autora reporta-se, a esse propósito, à lição de José Frederico Marques, para quem, “no sistema de juízo único, a violação do duplo grau de jurisdição fere o devido processo legal”.
Tem-se como indeclinável o duplo grau de jurisdição, ensejando-se o uso da apelação contra a sentença de primeiro grau, quando este é constituído por juízo de primeiro grau. Não se afasta, porém, sua importância mesmo nos regimes em que as causas sejam julgadas, em primeiro grau, por órgãos colegiados, como sucede, em regra, no processo dos países europeus. Na França, que segue esse modelo, Natalie Fricero proclama: “Pour garantir une bonne justice, Il faut accorder au plaideur qui a succombé en premier instance le droit de faire rejuger son affaire em fait et em droit par une juridiction hiérarchiquemente supérieure”.
Ora, tendo-se como inerente ao devido processo legal o princípio do duplo grau de jurisdição, não se pode deixar de admitir que o recurso destinado a assegurá-lo, que é a apelação, seja dotado, em regra, de efeito suspensivo. Interpuesto el recurso – diz Eduardo Couture –, no solo se opera el envio al superior para la revisión de la sentencia, sino que también, como complemento necesario, sus efectos quedan detenidos. Según el precepto clásico, appellatione pendente nihil innovandum”.
Parece acertada, pois, a orientação afinal acolhida pelo projeto de novo Código de Processo Civil, segundo o texto aprovado pela Câmara dos Deputados. Tal orientação mostra-se coerente com o conjunto dos preceitos que tendem a consagrar, no novo estatuto processual, o devido processo legal, tornando mais seguro o acesso à justiça.

4. Acesso à Justiça e meios alternativos de solução de conflitos

O acesso à justiça não implica, necessariamente, o uso das vias judiciais. A justiça já não é mais considerada, no Brasil, monopólio do Poder Judiciário. Se é certo, como prevê o citado dispositivo constitucional, que A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV), não se contesta, por outro lado, que, até para dar efetivo cumprimento a essa norma, o Judiciário pode – e deve – contar com o concurso de instâncias alternativas de solução de conflitos, às quais as partes tenham acesso no exercício da sua liberdade de agir.
Sensível a essa realidade, o novo Código de Processo Civil, ao mesmo tempo em que incorpora, ao respectivo texto, o preceito constitucional supra (art. 3º, caput), permite a arbitragem, na forma da lei (art. 3º, § 1º), diz que O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos (art. 3º, § 2º) e estabelece, no § 3º do mesmo artigo:

A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

É significativo que, depois de insculpir, no caput do artigo em referência, a norma que, no nosso direito positivo, constitui a melhor expressão do devido processo legal, o novo Código faça alusão expressa aos meios alternativos de solução de conflitos, como a dizer que, por essas vias, também se pode realizar o due process of law.
Trata-se, portanto, de admitir o uso de tutelas diferenciadas, além daquelas de caráter estritamente processual, em perfeita consonância com o princípio do devido processo legal.
Observa Leonardo Greco que “A tutela diferenciada abrange os meios alternativos de solução de conflitos, como a mediação, a arbitragem e a justiça interna das associações”, a par dos “juizados especiais para causas de menor complexidade, os juízes de paz e juízes leigos, e a adoção pela lei processual de procedimentos concentrados de cognição sumária”. A conformidade das tutelas diferenciadas com o devido processo legal passa pela observância da característica essencial que se lhes impõe, segundo acrescenta o citado autor:

“É característica essencial da tutela diferenciada a sua utilização opcional ou facultativa, pois muitos desses meios não se revestem das garantias habituais dos magistrados ou não se prestam à ampla discussão de todas as matérias de fato e de direito que poderiam ser alegadas num processo mais amplo”.

Entre outros meios alternativos de solução de conflitos, Leonardo Greco menciona a atribuição de poderes judicantes aos Juízes de Paz e o incremento da justiça interna das associações, de que temos exemplo no precedente da justiça desportiva.
Compartilhamos do pensamento do ilustre processualista no que diz respeito aos Juízes de Paz. Abordando o papel representado pelo juiz de paz, em nosso país, até o regime da Constituição de 1946, procuramos mostrar, em artigo de doutrina, como, a exemplo do que, ainda hoje, sucede em Portugal, seria importante a contribuição desses magistrados, no julgamento de pequenas causas, notadamente se as suas funções passassem a ser exercidas por bacharéis em direito .
Quanto à justiça desportiva, cumpre lembrar que a Constituição vigente dedica-lhe dois dispositivos do art. 217. No § 1º, adota, em matéria de ações relativas à disciplina e às competições desportivas, a regra do prévio esgotamento das instâncias da justiça desportiva, assinando-lhe, no § 2º, o prazo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final, nos casos de sua competência. É uma experiência que, entre nós, tem-se mostrado exitosa, a despeito de certas tentativas (aliás, sempre frustradas) de levar para a justiça comum o exame de determinadas questões relativas às práticas esportivas (sobretudo, o futebol), a pretexto de envolverem direitos dos espectadores, supostamente protegidos pelo Código do Consumidor.
Ainda que a imaginação criadora dos juristas possa conceber outros meios alternativos para a solução dos conflitos, não se conseguirá desafogar o Judiciário do volume de processos que o assoberba, sem que os órgãos estatais e as empresas públicas tomem consciência de que no seu âmbito se situa um dos focos mais salientes desses conflitos. Até por um imperativo da moralidade administrativa – não raro atingida pelo ânimo demandista dos órgãos públicos –, o Estado precisa reduzir o seu contencioso, aceitando as orientações jurídicas que lhe sejam adversas e reconhecendo os direitos dos administrados. Para tanto, impõe-se atribuir maior alcance ao caráter normativo de pareceres emanados de suas consultorias jurídicas e às decisões dos colegiados que têm competência para julgar determinadas questões, bem como criar novas instâncias de julgamento no âmbito administrativo, deixar de recorrer indefinidamente acerca de matérias que já tenham orientações contrárias firmadas pela Justiça, conferir maior poder de atuação às agências reguladoras de serviços públicos, conter a voracidade fiscal, pagar os precatórios, agir, em suma, com a seriedade que se espera de entidades incumbidas de velar pelo interesse público e contribuir para o cumprimento das leis.
Pode-se dizer, sem hipérbole, que o comportamento do Estado brasileiro, nesse campo, conspira contra a eficácia do devido processo legal. Aí reside um dos pontos nevrálgicos do acesso à justiça, entre nós.

5. Acesso à Justiça, estrutura e funcionamento do Poder Judiciário

A circunstância de todo o arcabouço do Poder Judiciário brasileiro achar-se delineado no texto da Constituição, que institui os tribunais federais e autoriza a criação dos órgãos da Justiça estadual, além de definir a composição dos Tribunais Superiores, representa singular garantia para a existência do devido processo legal. Tem o Judiciário, no Brasil, estrutura eminentemente constitucional. Isso o distingue, por exemplo, do Poder Judiciário americano. O fato de que a “organização e [a] jurisdição [do Judiciário nos Estados Unidos] dependem, em grande parte, de dispositivos estatutários”, retira da Justiça americana, segundo observa Bernard Schwartz, muito do seu poder.
A Constituição, todavia, não engessa a estrutura dos órgãos do Poder Judiciário que, pela natureza da sua competência, poderão exigir, com o tempo, ampliação dos seus quadros. Assim, ao organizar o Superior Tribunal de Justiça, diz que este se compõe de, no mínimo, trinta e três Ministros (art. 104), permitindo, portanto, que aquele Tribunal Superior venha a ter sua composição aumentada.
O aumento do número de juízes do Superior Tribunal de Justiça não tem sido considerado, por aquela Corte, como solução para a crise que ela enfrenta. Em vez disso, preferem os seus ilustres juízes (assim como os eminentes Ministros do Supremo Tribunal Federal) utilizar instrumentos tendentes a submeter a filtros mais espessos os recursos interpostos, no afã de reduzir ao extremo o número dos que devam ser julgados. O juízo de admissibilidade do recurso especial (tanto quanto o do recurso extraordinário) tem obedecido a critérios formalistas, em que o exame do direito material acaba relegado a plano inferior. Há muito, passou a figurar na sistemática dos recursos, à margem da previsão legal, nova modalidade de embargos de declaração, cuja finalidade não é, propriamente, a de esclarecer ou suprir pontos obscuros, contraditórios ou omissos do julgado, mas, sim, a de fazer com que se explicite a questão federal que será objeto do recurso especial ou do recurso extraordinário, ainda mesmo quando ela já esteja claramente ventilada no processo. Os chamados embargos prequestionadores são, no fundo, um obstáculo a transpor, colocado no caminho da parte que intenta recorrer, na expectativa de que ela não consiga fazê-lo e. assim, poupe o tribunal do encargo de julgar mais um recurso… Chega-se ao extremo de exigir a oposição de embargos com esse fim até mesmo quando a violação da questão federal surge na própria decisão recorrida e, portanto, salta aos olhos do julgador, ao primeiro exame. É essa a manifestação mais radical do formalismo que cerca tal exigência.
Tais expedientes, ao lado de outros da mesma natureza, caracterizam o que vem sendo chamado, na linguagem forense, de jurisprudência defensiva. Bem observa, ao analisá-la, apontando outras manifestações desse fenômeno, o Prof. Márcio Carvalho Faria, que “O direito processual, infelizmente, tornou-se uma armadilha para o direito material quando, ao revés, deveria ser mero instrumento de sua aplicação”.
Seria de bom alvitre tomar como referência, nesse campo, a disposição contida no art. 14 do Código General del Proceso, do Uruguai:

Artículo 14. Interpretación de las normas procesales.
Para interpretar la norma procesal, el tribunal deberá tener em cuenta que el fin del proceso es la efectividad de los derechos sustanciales.

O ingresso na magistratura é outro tema que não se pode dissociar do escopo de aperfeiçoamento do devido processo legal.
O concurso público continua sendo importante forma de seleção dos candidatos à magistratura, porque evita o arbítrio da escolha pessoal, tanto mais perigoso num país como o Brasil em que os costumes políticos não são se afinam com os melhores padrões Mas o sistema de concursos tem suas fragilidades. É um sistema que apura a qualificação do candidato em determinado momento e sobre certos assuntos, sem possibilitar uma avaliação mais ampla da sua capacidade, do seu equilíbrio pessoal e da sua conduta social. Não chega a revelar a real vocação do bacharel para o exercício da judicatura. Atualmente, nem mesmo a um exame psicotécnico submete-se o candidato, de modo que alguns atributos da personalidade, reveladores da aptidão para a carreira, possam ser analisados.
Cremos que o modelo ideal de seleção de candidatos à magistratura é o da formação em escola especializada. Roberto Rosas compartilha desse entendimento, expondo assim uma de suas propostas com vistas ao aprimoramento do sistema: “A carreira de magistrado deve iniciar-se na escola da magistratura. A admissão dá-se para a realização de curso seriado, a exemplo do Instituto Rio Branco e das academias militares, mediante remuneração”.
É esse o sistema adotado na França e em outros países europeus. Na América Latina, também o Peru instituiu sua Academia da Magistratura, “que forma parte del Poder Judicial, [e] se encarga de la formación y capacitacións de jueces y fiscales em todos sus niveles, para los efectos de su selección.” – conforme dispõe a Constituição daquele país, no art. 151. Na Costa Rica, a Escola Judicial, destinada aos mesmos fins, foi criada pela Lei nº 6.593, de 06 de agosto de 1981, cujo art. 16 preceitua que, na referida instituição “se darán cursos de formación o ingreso y de perfeccionamiento”.
Há, da parte de muitos militantes do foro, em nosso país, tendência de atribuir ao juiz de primeiro grau maiores poderes decisórios, preconizando, até, alguns estudiosos do processo a atribuição de efeito meramente devolutivo à apelação – ideia que, como vimos, não deverá vingar no novo Código de Processo Civil. Não faltam, mesmo, os que consideram o duplo grau como um dogma que deveria ser abandonado, em prol da maior celeridade dos processos. Não fazemos coro com tais ideias. E uma das razões que nos impedem de acompanhar seus ilustres corifeus está em que, segundo nos parece, o sistema de recrutamento de juízes, no Brasil, mostra-se bastante falho, não permitindo crer que o nível de preparo dos juízes de primeiro grau possa dispensar a revisão de suas sentenças por colegiados presumivelmente formados por magistrados mais experientes e capazes ou, mesmo, diferir tal reexame para momento posterior à execução das sentenças.

6. Acesso à Justiça e exercício da advocacia

Assinala Osvaldo Gozaíni que a expressão acesso à justiça “alude a un ponto de partida, a una visión realista de la función jurisdiccional que abarca y permite observar, cómo y por qué medida una persona, un grupo o una colectividad, logran el efectivo ejercicio de sus derechos individuales y sociales mediante la ayude del Estado. Pero, además, implica un cambio epistemológico que coloca em la mira del estudioso, em un primer plano privilegiado, al justiciable como consumidor del sistema jurídico, sin dejar de atender a los operadores del derecho, que deben servir a quél y que son los jueces, abogados, auxiliares de la justicia, etc”.
No Brasil, avulta o papel do advogado na prestação jurisdicional, uma vez que a Constituição, expressamente, proclama que O advogado é indispensável à administração da justiça (art. 133).
É o advogado o elo indispensável entre o jurisdicionado e os juízes. E isso o insere no contexto do Poder Judiciário, como protagonista do exercício da função jurisdicional
Torna-se, por isso, necessário assegurar ao advogado determinadas garantias, que lhe permitam desempenhar com independência o múnus de que se acha investido. O citado artigo da Constituição acrescenta que o advogado é inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei – o que lhe confere a chamada imunidade judiciária. O Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 – confere ao advogado, no seu art. 7º, uma carta de direitos, cujo destinatário imediato é o profissional, mas que tem como beneficiário o constituinte que ele representa. Na medida exata em que esses direitos têm efetividade, na vida judiciária, pode-se dizer que o acesso à justiça acha-se garantido em sua plenitude.
Impende verificar, pois, as condições em que o exercício da advocacia se dá, no país, para que se possa aferir a real situação do acesso à justiça e a correta realização do devido processo legal, no ordenamento jurídico nacional.
De um modo geral, os direitos assegurados pelo Estatuto da Advocacia são cumpridos, na prática. Há, todavia, uma exceção que se vem alargando de tal forma que o observador mais atento, em face de ocorrências comuns no dia a dia forense, chegará a supor que o costume revogou a lei.
Dispõe, com efeito, a citada Lei nº 8.906/1994, no art. 7º, VIII, que, entre os direitos conferidos ao advogado, está o de

Dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada.

Na realidade, esse dispositivo é frequentemente ignorado. O acesso dos advogados aos juízes é, cada vez mais, dificultado. Ao dirigir-se ao gabinete do magistrado, o advogado é, quase sempre, recebido por assessores que, cumprindo instruções superiores, procuram impedir que o profissional vá ter à presença do juiz. Há, mesmo, juízes que se arrogam o direito de não receber advogados, fazendo disso uma norma de conduta. São reiteradas as queixas dos advogados a esse respeito e não se veem atuações das Corregedorias de Justiça no sentido de coibir semelhante prática.
É esse um grave obstáculo com que se defrontam os advogados no exercício da sua profissão. E aí reside, certamente, um dos pontos mais vulneráveis do acesso à justiça, nos dias de hoje.
A Defensoria Pública tem papel relevante no campo do acesso à Justiça, uma vez que ela “viabiliza a que se concretize, em todos os graus e instâncias, a assistência jurídica, integral e gratuita, elencada entre os direitos e deveres individuais e coletivos – art. 5º, LXXIV –, possibilitando, assim, o efetivo acesso à jurisdição – no sentido de inserção, em ordem jurídica legítima e justa – de todo um vasto contingente da malha social”.
No ordenamento jurídico brasileiro, a Defensoria Pública acha-se plenamente estruturada. A Constituição a prevê (art. 134), a Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994, Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para a sua organização nos Estados” e o Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/1994) a concebe como ramo da advocacia pública (art. 3º, § 1º). Na prática, observam-se deficiências de sua implantação, em alguns estados, onde a instituição não dispõe de quadros bastantes para atender à demanda crescente. Para obviar a essas dificuldades, firmam-se convênios com a Ordem dos Advogados do Brasil, de modo que o atendimento das partes que acorrem ao sistema da justiça gratuita seja feito com a participação de advogados privados. Mas o funcionamento desse mecanismo auxiliar também revela problemas, que chegam a comprometer-lhe a existência. Isso explica por que, no plano da assistência jurídica, ainda resida mais um fator negativo do acesso à justiça, entre nós.

7. Conclusões

De todo o exposto, chega-se à conclusão de que o acesso à justiça, no Brasil, padece, ainda, de muitas falhas.
O sistema processual mostra-se satisfatório para atendê-lo, ao disciplinar um processo consentâneo com as características do devido processo legal. Mas a prática judiciária não dá fiel cumprimento ao princípio que rege esse sistema.
Aliás, o Judiciário brasileiro parece haver esgotado a capacidade de atender, em condições razoáveis de eficiência e de tempo de duração dos processos, à demanda dos jurisdicionados. Urge incrementar os meios alternativos de solução de conflitos. Uma nova perspectiva se abre, nesse particular, com o advento, em breve, de um novo Código de Processo Civil, que, além de aprimorar o devido processo legal, notadamente no que concerne ao contraditório, incentiva a mediação, a arbitragem e a conciliação.
A estrutura do Poder Judiciário requer aperfeiçoamento. O ingresso na magistratura precisa ajustar-se a modelos já adotados em outros países, indo além da mera exigência de um concurso ou transformando este em simples meio de acesso a curso ministrado por escola especializada.
O formalismo que impera no plano dos recursos de natureza extraordinária e que se expressa, notadamente, na existência, à margem da lei, dos chamados embargos prequestionadores, não se compadece com o devido processo legal. Outros aspectos relativos ao formalismo exagerado precisam ser corrigidos, havendo também, a esse respeito, fundadas esperanças de que novo panorama se descortine, com a conversão em lei e a entrada em vigor do futuro Código de Processo Civil. A chamada jurisprudência defensiva é algo paradoxal no funcionamento do Judiciário brasileiro, em tudo e por tudo incompatível com o regular acesso à justiça. Trata-se de um fenômeno cujo desaparecimento marcará, por certo, a superação de práticas viciosas e contribuirá, sem dúvida, para a melhor prestação jurisdicional.
O advogado, elemento essencial à administração da Justiça, deve ter as suas prerrogativas respeitadas. O direito que a lei lhe assegura de dirigir-se, diretamente, aos juízes de qualquer instância, no exercício do seu múnus, é uma faceta do acesso à justiça que precisa ser resguardada, em prol dos interesses dos jurisdicionados.
Os órgãos da Defensoria Pública precisam ser prestigiados pelos governos estaduais, suprindo-se as lacunas que se verificam em seus quadros, de modo que aquela instituição cumpra o importante papel que a Constituição lhe confere e que é indispensável ao acesso à Justiça.
Os vícios e os problemas apontados reclamam correção para que se tenha, realmente, no país, pleno acesso à justiça e o devido processo legal seja uma garantia a todos assegurada.

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Fonte da Notícia: Paulo Roberto de Gouvêa Medina

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